quarta-feira, 21 de outubro de 2009

À base de galinhas roubadas e fiel aos amigos, Bruno deixa o ‘Buracão’ para trás

Amigos de infância contam a história do goleiro que saiu de Ribeirão das Neves para conquistar a maior torcida do Brasil

Se o crescimento do ser humano está diretamente ligado à capacidade de aprender com as lições dos momentos mais difíceis, passada a revolta e o desabafo após o “caso X-9″, Bruno deve ter deixado mais aguçada aquela que garante ser uma de suas principais características: a fidelidade. Sem medir as palavras, o goleiro do Flamengo agradece aos colegas que o futebol lhe deu, mas deixa claro que amigos de verdade só tem dois: Luís Henrique, o Macarrão, e Luciano, o Lulu.

Durante a estada do Flamengo em Belo Horizonte para a partida contra o Cruzeiro, o GLOBOESPORTE.COM foi atrás da dupla. Maiores incentivadores de Bruno, Macarrão e Lulu mostraram o caminho que o goleiro fez dos campos de terra em Ribeirão das Neves, na Grande BH, até se tornar em um dos grandes ídolos da maior torcida do Brasil nos últimos anos.

Carlos Mota/GLOBOESPORTE.COM

No ‘Buracão’, Bruno deu seus primeiros chutes, antes das primeiras defesas

- Grandes amigos que tenho e passamos por muitos momentos difíceis. São os companheiros que amanhã ou depois vou levar sempre comigo. Luciano é pai de família, um cara responsável. E o Macarrão está ao meu lado para o que der e vier. Se eu jogar na Europa um dia, vai me acompanhar. Eu ainda peço: “quero que você me xingue, estou fazendo a coisa errada”. Mas ele vem na base da conversa. E isso que é amizade de verdade – deu a dica o camisa 1 rubro-negro.

Mais do que amigos, Macarrão e Lulu sempre foram os protetores. Desde a infância, no campinho de terra batida chamado “Buracão”, localizado em um terreno baldio e apelidado por ser em um nível abaixo o da área residencial do local. Depois de peregrinar por regiões pobres da capital mineira com a avó – que ele considera a verdadeira mãe – Estela e o avô Roberto, Bruno se fixou em Ribeirão das Neves aos sete anos. Entre uma tentativa ou outra de ser atacante, acabou parando no gol.

Clique aqui e veja a galeria de fotos com a história de Bruno em Ribeirão das Neves!
- A gente sempre viu que ele era diferenciado. Aqui no Buracão foi onde tudo começou. O Bruno gostava de jogar do meio para frente, queria fazer teste para o Galo como lateral, mas a gente falou para ele que dava mais certo no gol. Logo nesse treino ele pegou 16 pênaltis de 18 que foram cobrados, um foi para fora e só um foi gol – garante Lulu.

Galinhas ’somem’ e viram dinheiro para passagem

Carlos Mota/GLOBOESPORTE.COM

Ao lado de Lulu (de azul), Bruno comemora a aprovação na peneira do Atlético-MG

Com ele, por sinal, Bruno tem uma espécie de dívida ilegal. Quando ainda tentavam a sorte nas categorias de base do Atlético-MG, Lulu e Bruno por vezes deixavam de treinar por faltar dinheiro para a condução. Nada que arrumar uma “companheira” para o Galo não resolvesse.

- Às vezes eu chamava o Bruno para ir treinar e ele dizia: “Como rapaz? Não tenho dinheiro”. Eu respondia: “Vamos embora que as galinhas da velha renderam bem”. Depois minha mãe perguntava onde estavam as galinhas e eu ainda perguntava: quem será que roubou? – recorda aos risos.

- Até hoje o Luciano brinca comigo porque ele vendia galinha escondido da mãe dele para poder me dar dinheiro. O Macarrão trabalhava no Ceasa e me dava uma grana para eu poder treinar. E hoje eu reconheço isso e tento ajudá-los da melhor maneira possível – emenda Bruno.

O fiel escudeiro, no entanto, é Macarrão. Responsável pela administração do sítio do goleiro em Ribeirão das Neves, ele recorda quando conheceu o amigo, há dez anos. Na época, teve de administrar a faceta “durona” de Bruno: a de treinador de goleiros.

- Quando foi mandado embora do Cruzeiro pelo Ney Franco, o Bruno resolveu que não ia jogar mais futebol e veio ser nosso treinador de goleiros no projeto Toriba. Ele sempre foi muito determinado. Só pensava em trabalhar, trabalhar, trabalhar… E o pessoal só queria olhar para as meninas. Fico até emocionado de voltar a este campinho. Passamos muita coisa boa aqui. Vínhamos por causa do suco, do leite com achocolatado, mas valia muito a pena. O Bruno merece estar onde está porque sempre foi muito determinado e diferenciado – recorda ao falar do Projeto Toriba, na escola Caic, em Ribeirão das Neves.

Saiba mais sobre a história de Bruno no Campeonato Brasileiro!
A lembrança também é compartilhada pelo ex-treinador e atual camisa 1 do Flamengo.

- O que não esqueço é quando a gente se reunia no projeto Toriba que o governo fez. Me lembro que a gente saía cedo, 7h, e se reunia e ia para o treino. A parte mais engraçada era aquela zoação, de um brincando com o outro. Chegava lá, tinha que tomar café lá porque não havia nada para comer em casa. Um pegava o biscoito do outro – endossa Bruno.

Mais do que amigos, fãs de carteirinha

Carlos Mota/GLOBOESPORTE.COM

Melhor amigo de Bruno, Macarrão mostra a coleção de camisas do goleiro do Flamengo

Chamado pelo rubro-negro de irmão, Macarrão se divide entre Belo Horizonte e o Rio de Janeiro, onde acompanha de perto a carreira do ídolo. “Goleiro frustrado”, ele se realiza ao ver o amigo defendendo um dos maiores clubes do Brasil e não esconde o lado fã.

- Guardo todas as camisas que ele joga. Tenho algumas que nem ele tem e tenta me comprar. Mas não tem preço – diz orgulhoso, que tem como relíquia uma camisa branca dos tempo de Atlético-MG, a camisa de final do Estadual de 2007 e a do centésimo jogo pelo clube.

Referência em Ribeirão das Neves, mesma terra do tricampeão mundial com a seleção brasileira Piazza, Bruno é o espelho para familiares. Serginho lembra uma das primeiras coisas que o primo fez, quando ainda estava na base do Galo.

- Logo quando começou ele fez questão de fazer uma reforma na casa e melhorar a condição de vida.

Realizado no futebol, Bruno vai à terra natal anualmente para realizar uma festa de fim de ano. Nada, no entanto, que diminua o carinho dos amigos por ele.

- Muito sucesso aí, cara. Você merece – faz questão de desejar Lulu.

- Você é meu ídolo – reforça Serginho.

Macarrão, entretanto, é mais sucinto:

- Te amo!

Duas palavras que mostram a força de relação de Bruno com aqueles que o “mandaram para longe” de Ribeirão das Neves, onde ele não precisou, desde o princípio, de combater qualquer “X-9″.

Nenhum comentário:

Postar um comentário